Trocas de mensagens obtidas pela PF (Polícia Federal) mostram que militares envolvidos no suposto plano de golpe de Estado faziam piadas com a possibilidade de serem presos.
Pelas investigações da corporação divulgadas nesta 3ª feira (26.nov.2024), os oficiais redigiram, negociaram e assinaram uma carta com “teor antidemocrático”. O documento, intitulado “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”, seria enviado aos chefes das Forças Armadas.
Em uma conversa entre o oficial Roland Araújo e o major Sergio Cavaliere mostram a dinâmica para redigir a carta aos oficiais do Exército. Nas mensagens, enviam uma figurinha do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes com “cabeça de pênis” e dizem “vamos ser presos por ele”.
Os militares seguem a conversa e começam a citar os codinomes de outros integrantes do Exército que também assinaram o documento. Pela quantidade, Cavaliere responde que já seria possível “bater um golzinho no banho de sol”, em referência a jogar futebol no período de luz solar que presidiários têm direito quando cumprem suas penas.
Em outra conversa entre o tenente-coronel e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), Mauro Cid, e o coronel Bernardo Romão Corrêa Netto, falam sobre o resultado de uma reunião em 14 de dezembro de 2022. Correa Netto pergunta: “GFG cagou?” e depois reafirma “GFG cagou solenemente”.
À PF, Cid confirmou que a reunião era com o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e com os comandantes das Forças Armadas. Segundo o tenente-coronel, o ministro apresentou a minuta do decreto para reverter o resultado das eleições presidenciais.
Cid também informou que GFG se referia ao general Freire Gomes, que se posicionou de maneira contrária à proposta de golpe.
Eis alguns trechos do depoimento:
ENTENDA
- o que aconteceu: o ministro do STF Alexandre de Moraes retirou o sigilo do relatório da Polícia Federal que investiga uma tentativa de golpe de Estado no final de 2022. Também enviou o inquérito à PGR;
- o que é investigado: um grupo aliado a Jair Bolsonaro (PL) que teria tentado impedir a posse do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O plano seria, segundo a PF, matar Lula, o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) e o então presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Alexandre de Moraes. A operação teria a participação de militares e usaria armas de guerra e veneno;
- quais são as dúvidas: quantas pessoas estiveram envolvidas diretamente se o plano foi efetivamente colocado em curso. Leia aqui o que se sabe e quais são as dúvidas sobre o inquérito;
- quem estava envolvido: a investigação, concluída pela corporação na 5ª feira (21.nov), levou ao indiciamento de 37 pessoas. Entre elas, estão:
- Bolsonaro;
- Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil e candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro;
- Augusto Heleno, ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional);
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
- Valdemar Costa Neto, presidente do PL.
- quais os próximos passos: a manifestação sobre uma possível denúncia da PGR deve ficar para 2025, depois do recesso do Judiciário, que termina em 6 de janeiro.
RELATÓRIO DA PF
A Polícia Federal concluiu que núcleos foram agrupados para disseminar a narrativa de fraude nas eleições presidenciais de 2022, antes mesmo da sua realização. A finalidade seria legitimar uma intervenção das Forças Armadas.
Seriam 5 eixos de atuação:
- ataques virtuais a opositores;
- ataques às instituições (STF e TSE), urnas eletrônicas e à higidez do processo eleitoral;
- tentativa de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado democrático de direito;
- ataques às vacinas contra a covid e a medidas sanitárias na pandemia; e
- uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens.
O QUE DIZ BOLSONARO
O ex-presidente negou ter conhecimento do esquema para matar Lula ou da tentativa de golpe. Disse que sempre agiu “dentro das 4 linhas de Constituição” e que, nelas, “não há pena de morte”, em referência ao assassinato do petista.
“Vai dar golpe com um general da reserva e 4 oficiais superiores? Pelo amor de Deus. Quem estava coordenando isso? Cadê a tropa? Cadê as Forças Armadas? Não fique botando chifre em cabeça de cavalo”, disse em live transmitida pela página do Instagram do ex-ministro do Turismo Gilson Machado no sábado (23.nov).