O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump (Partido Republicano), toma posse na 2ª feira (20.jan.2025), mas já tem vocalizado que planeja proibir novos parques eólicos no país. Declarou em 7 de janeiro que “nenhum novo moinho de vento” será construído durante o seu mandato, o 2º à frente dos EUA. Também criticou o atual presidente, Joe Biden (Partido Democrata), que aprovou 11 iniciativas para incentivar os complexos eólicos offshore.
Com a promessa de “ter uma política onde não serão construídos aerogeradores”, Trump fustiga Estados governados por democratas na Costa Leste –Nova York, Nova Jersey e Massachusetts– que deram início à construção de empreendimentos offshore. A estratégia é calculada: os 3 maiores produtores de energia eólica em terra (onshore) dos EUA são Estados comandados por republicanos –Texas, Iowa e Oklahoma.
“A proibição da [eólica] offshore pode vir a ocorrer, pois o mar é territorial e Trump o controla. Já as usinas em terra são construídas em áreas privadas e são os Estados que têm o poder sobre o território e as lideranças ambientais”, afirmou Elbia Gannoum, presidente da Abeeólica (Associação Brasileira de Energia Eólica) e vice-presidente do Board da GWEC (Global Wind Energy Council), ao Poder360.
A contenda de Trump é antiga. Em 2012, ele havia tentado impedir a construção de um parque eólico perto do seu campo de golfe em Aberdeenshire, na Escócia. Alegou que prejudicaria a paisagem e afetaria negativamente o valor da propriedade. Mas o futuro presidente tende a não ter vida fácil. O novo líder dos republicanos no Senado será John Thune, um congressista da Dakota do Sul, o 5º maior produtor de energia eólica do país.
As declarações de Trump encontram eco na Alemanha, onde o partido AfD (Alternativa para a Alemanha, direita) tenta angariar eleitores com um discurso crítico às fontes renováveis de energia. Em 11 de janeiro, a co-líder da legenda, Alice Weidel, classificou as turbinas eólicas como “moinhos de vento da vergonha” e prometeu derrubar todas as instalações se for eleita chanceler nas eleições de 23 de fevereiro de 2025.
Trump já declarou também que irá retirar novamente os EUA do Acordo de Paris, como fez em 2017. Sob o slogan “drill, baby, drill” (perfure, bebê, perfure, em tradução para o português), anunciou 2 nomes pró-petróleo para compor o 1º escalão do seu novo governo:
- Doug Burgum, governador do Estado petrolífero da Dakota do Norte – acumulará a chefia da Secretaria de Interior e do Conselho Nacional de Energia;
- Chris Wright – o CEO da Liberty Energy será o próximo secretário de Energia.
Ambos precisam ainda da chancela do Senado, que será de maioria republicana.
O movimento de Trump contra as eólicas offshore ocorre no momento em que o Brasil acaba de sancionar o marco legal da energia eólica em alto-mar e se prepara para sediar a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas), em novembro.
POSIÇÃO DE TRUMP AJUDA O BRASIL?
Depois de uma longa batalha no Congresso, Lula sancionou a lei que regulamenta a energia eólica offshore com veto aos 6 “jabutis” –emendas sem relação com o texto original– enxertados pela Câmara no projeto de lei.
De acordo com um estudo elaborado (PDF – 3 MB) pela consultoria PSR, as medidas adicionais acarretariam aos consumidores um custo de R$545bilhõesaté 2050. São elas:
- R$ 155 bilhões – contratação de 4.250 GW de térmicas a gás;
- R$ 140 bilhões – contratação de 4.9 GW de PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas);
- R$ 101 bilhões – postergação dos prazos para subsídios à micro e minigeração solar;
- R$ 92 bilhões – prorrogação dos contratos das térmicas a carvão até 2050;
- R$ 28 bilhões – contratação de hidrogênio líquido oriundo do etanol;
- R$ 24 bilhões – extensão dos contratos do Proinfa;
- R$ 5 bilhões – contratação específica para eólicas do Sul.
A manutenção dos vetos pelo Poder Executivo ainda depende da apreciação de senadores e deputados, que podem derrubar a decisão presidencial. O Poder360 apurou que o governo entrará em campo para mantê-los e, em último caso, cogita até judicializar o caso no STF (Supremo Tribunal Federal). Mas há uma forte pressão de congressistas ligados a bancadas regionais e do agronegócio para retomar os trechos suprimidos.
Internamente, o Ministério de Minas e Energia avalia que a posição de Trump contra as eólicas offshore pode levar a uma migração de capital e de fornecedores para o Brasil. A questão, no entanto, pode esbarrar na possível derrubada dos vetos aos jabutis. Neste cenário, a avaliação é de que haveria demanda a ser atendida para a energia éolica offshore.
A presidente da Abeeólica, por sua vez, afirma que se a interrupção de novos projetos offshore for levada adiante por Trump, pode vir a favorecer o Brasil, que busca dar os primeiros passos para fomentar investimentos. Segundo ela, o país reúne condições para realizar o 1º leilão de cessão de áreas marítimas para projetos eólicos ainda em 2025: “É muito importante para o Brasil realizar um leilão neste ano em função da COP30”.
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Outros especialistas consultados discordam das análises favoráveis.
Para Edvaldo Santana, ex-diretor da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), os investimentos no ambiente offshore só ganharão tração no Brasil a partir de 2035: “Se ainda há um grande potencial da eólica em terra, uma alternativa mais barata, por que não utilizá-la primeiro?”.
Já Edmar Almeida, pesquisador do Instituto de Energia da PUC-RJ, considera que há um problema de competitividade econômica no setor eólico brasileiro, uma vez que o “excesso de capacidade de geração fez cair os preços da energia, mas não os custos de investimentos, o que dificulta a viabilidade de novos projetos, sobretudo em alto-mar”.
Também compartilha da mesma visão o diretor-presidente da PSR, Luís Barroso, que alerta para a falta de competitividade dos parques offshore e as dificuldades da cadeia de suprimentos: “Ainda é muito difícil justificar a competitividade desta fonte frente às demais opções de geração. A menos que o Brasil ofereça um super subsídio, é algo de longo prazo”.
Barroso citou o caso da Shell, que suspendeu novos investimentos por causa dos custos crescentes e os desafios relacionados à cadeia de fornecimento de bens e serviços. A petroleira chegou a firmar um acordo com a Eletrobras em 2022 para desenvolver projetos na costa brasileira e submeteu 6 projetos ao Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais), embora nenhum ainda esteja em fase de estudos.
Segundo o MME, a capacidade instalada da energia eólica em terra responde por 12% da matriz elétrica nacional. Mesmo antes da promulgação da nova lei, o Ibama já havia recebido 103 pedidos para licenciar projetos eólicos no litoral brasileiro.
Eis os pedidos de licenciamento (clique nas colunas para reordenar por empreendimento, empreendedor e MW).
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